Estava a regressar a casa depois do trabalho e vi uma rapariga que devia ter entre os 11 e os 13 anos, sentada no passeio. Estava sentada como uma bola, a abraçar as pernas e com a cabeça enfiada nos joelhos.
Estive quase para não lhe dizer ou perguntar nada, não fosse ela estar ali à espera de alguém e ainda a assustar, mas lembrei-me de mim mesma, numa situação diferente, há muitos anos atrás....
(Devia ter uns 13 anos e os meus pais moravam numa zona pouco habitada. Estava a regressar da escola e já era de noite. Apanhei o autocarro e já sabia que a minha paragem ficava logo a seguir a um restaurante que estava sempre bem iluminado. Lembro-me como se tivesse sido ontem; era 5a feira, o dia de encerramento, e as luzes que eu usava como «alarme» estavam apagadas. Falhei a paragem de saída e quando me apercebi acabei por entrar em pânico silencioso. Não podia estar ali porque não tinha bilhete válido, pelo que não podia pedir ajuda ao motorista. Não tinha dinheiro para apanhar o autocarro de volta e naquela estrada só havia pinhais e era perigoso. Não sabia de cor o número de casa (nem me lembro se tínhamos telefone ou não) e também não tinha dinheiro... Não chorava, não pedia ajuda, não nada. Fiquei congelada e sem saber o que fazer a seguir. Até que uma senhora reparou no meu ar de coelho apanhado nas luzes dos faróis e me perguntou se eu estava bem e se precisava de ajuda. E comecei a chorar convulsivamente... long story short, a senhora meteu-se comigo num táxi e levou-me a casa dos meus pais, que já estavam a ter um ataque cardíaco com o meu desaparecimento...)
E porque me lembrei disto, decidi não se parva e dirigir-me à rapariga e certificar-me que estava tudo ok. E assim que lho perguntei, desatou a chorar. Que não, que não estava tudo nada bem... O pai devia te-la ido buscar e não aparecera. Não tinha o telemóvel dela e não sabia o que fazer. A solução não podia ter sido mais simples. Emprestei-lhe o meu telemóvel, ela ligou para casa, ficou a saber que o pai não percebeu que era suposto ir apanhá-la e que ia já a caminho. A mãe da menina quis falar comigo e agradeceu-me por telefone o ter-me preocupado, tal como me lembro de os meus pais terem agradecido a senhora que me levou a casa.
Não a quis embaraçar na sua atrapalhação e por isso depois de lhe perguntar se ela queria que eu ficasse a fazer-lhe companhia e de ela me ter dito que não era preciso, fui-me embora. Avancei 50 metros e fiquei na sombra escondida a vê-la mais 10 minutos até um carro parar e ela saltar logo lá para dentro.
Demorou 20 anos, mas uma espécie de pequeno círculo de ajuda fechou-se...